sábado, 6 de novembro de 2010

Meu sonho de dormir pra sempre no sonho

Onde está tudo aquilo? As poesias de mar recitadas a seco, os sanduiches de carne da madrugada, os filmes de Godard ensaiados nus no tapete da sala? Onde está aquele peso do mundo dividido num café preto de bar, o carinho delicado de um diabo, a companhia e o sentimento de elo sobrenatural? Onde está a natureza das coisas e o cheiro de incenso que isso tudo tinha. Hoje à noite, cheira a imensidão de um pântano escuro, um vazio de aromas.
Quero ser cada pintura desse sonho, um álbum de fotos, decadentista, pra não esquecer do absurdo que é encontrar-se no outro, sozinha. Amo-te.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

porque pintei as unhas hoje?

elas sempre tiveram um aspecto ridículo
e nunca me preocupei
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxem melhorar a situação delas

minhas mãos é que precisariam de cuidados

pra se ter um conjunto de unhas bonitas
antes
as mãos precisam de beleza
delicadeza

...

tanto veneno nas veias pra saturar
tantos músculos pra descontrair
as pupilas
xxxxxxxxxxdiminuir
a felicidade sintética
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxesgotar
a porrada do silencio ser decisiva
e a louça suja do antigo poema pra se lavar

mas não

procurei um esmalte no espelho do banheiro
fora da validade
xxxxxxxxxxxxxxxxobvio
-liláz?
cor assim, tão... sei lá
e pintei os dez quadradinhos de queratina fraca

combinou com o anel de prata meio corroído
pareço até uma punk adolescente

acho que foi uma
tentativa imbecil de provar a transitoriedade
e a transitoriedade do imbecil

logo eu
que sonho com a história
e os mitos
e um próximo...

preciso ouvir um solo clássico do rock
ler mais Nietzsche
comer mais doces
enfiar meus pés num balde de guache

é



xxxxisso

terça-feira, 24 de agosto de 2010

o chão de uma cozinha, eu, dermatobia hominis e o apego

cada movimento

é de extremo esforço
como daquele verme
gordo
no piso
frio



eu não entendo
mas como não entendo
só o tempo mesmo


e a falta

e a louça

fétida

na pia

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A Humana - Cadê meu satélite?


O Deus - Satélite?

A Humana - É... acho que eu tinha um.

O Deus - Huum... satélites te tiram a surpresa.

A Humana - Surpresa?

O Deus - Sim, todas elas.

A Humana - Por quê?

O Deus - Porque eles vêem tudo. Prevêem. (Gargalhadas de sabedoria e superioridade).

A Humana - É melhor andar sem satélites?

O Deus - Sim, só com a roupa do corpo. E com um ar de estranho.

A Humana - Você não tem um, então?

O Deus - Não.

A Humana - Entendi... Espero que não mesmo. Depois que você o tem, não se quer mais sem ele.
Porque depois que você o tem, é como uma esperança. Eu podia ser um pouco de satélite também.
Quando você dorme e sonha, ele te ilumina, tanto, que a pele vira pérola.
De dia não aparece, tá do outro lado, pela região da nuca. Sussurra um encontro noturno ou ritual, como quiser. Posso lembrar-me do hálito gelado, aqueles lábios pálidos do frio cósmico, leve rosado, como o falo e o cu.
Quando a escuridão azul se aproxima, ele está lá, iluminado, com aquele ar de estranho, só com a roupa do corpo, te chamando, pra reger, algum planeta sozinho.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

terça-feira, 6 de julho de 2010

culto atonal do desconcerto decomposto

muito

nesse corpo magro
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxredoma branca
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxde pelugens
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxe extremidades castanhas
xxxxxxxxxxxxxsou eu

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxoutros

xxxxxxxxxxxninguém
xxxxxxxsilêncio

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxacaso


o errado

enfim

não existe razão
para os átomos do mundo
e seus variantes
derivados
compostos
engravatados
desolados
mesmo assim
os números os têm

do mesmo modo

não existe linguagem
para o meu céu de fogo
mas a poesia
o têm

esse
xxxxxdeve ser errado
xxxxxde difícil procura e tradução

fácil em mim

são cores e formas indecentes
que num golpe
de silêncio
o sol se esconde
e chove canfora
pra uma noite insana



nada é errado
nada é certo
nada é mistério
tudo é bem vindo

a mentira é uma fábula
a verdade
uma dança estranha
sem ensaio

a maldade é piada
quase um fetiche
a bondade mais ainda

pra cada ser
uma breve função lógica
dispensável
mas agradável
daí
xxxxxxxxxxxxxxo arroz e feijão
xxxxxxxxxxxxxxo corte de cabelo
xxxxxxxxxxxxxxa cura dos enfermos
xxxxxxxxxxxxxxe os marceneiros

outros
manipulam a pedra e a tinta
cospem metáforas para um bom dia
chamam os sonhos
sopram o mar
e andam pelados

são
insubstituíveis


o sangue
o cheiro e o grotesco
está presente
nos alimentos
nos acasalamentos
na magia

no amor

por dentro e por fora de nós
e
no meu céu
todos gostam disso


homens e mulheres
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxum vinho
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxoutro taça
e disso
se bebe muito

mas do anel da garrafa
se bebe muito vinho também

enquanto isso
as taças dançam
num culto surreal
de alegria

o desapego
próprio do céu

todo dia é noite
e noite dia
de tudo e nada

até um outro céu

terça-feira, 29 de junho de 2010

terra de ninguém

moro no ventre jovem
de uma puta exausta

sou um feto descrente
de seu nascimento

500 anos de gestação
latino-americana

a minha espera
um berço empoeirado
verde-amarelo

e um chocalho tupi